DivertidaMente, da Pixar, tem um título original em inglês um pouco mais interessante: InsideOut, ou “de dentro pra fora”. A história mostra de um jeito ao mesmo tempo divertido e revelador como funciona o interior secreto de nossas mentes. Como cada uma de nossas cinco emoções interagem com a realidade e com nossas memórias para definir quem somos e a forma como atuamos no mundo. Muito mais do que um extraordinário filme de animação para famílias, DivertidaMente pode ser o início de um dos exercícios mais importantes e difíceis da vida de qualquer ser humano: se auto conhecer.
Apenas quando entendemos como essas cinco emoções teimosas e cheias de drama interagem com nosso desejo, com essa nossa vontade de ser alguém nesta existência, é que conseguimos desvendar os caminhos misteriosos de como cada uma delas contribui de uma forma muito particular e poderosa para que você sobreviva mas, principalmente, para que você viva a vida.
Medo, repulsa, raiva, felicidade e tristeza. Precisamos de cada uma delas durante todas as etapas de nossas vidas. Mas como quase tudo que é muito bom e poderoso, elas também são perigosas e requerem bastante cuidado. São elas que vão te levar ao sucesso ou vão te prender na terrível zona de conforto que destrói sonhos e corações. Reflita um pouco sobre cada uma delas. Pense sobre como o medo te protege, mas te imobiliza; como a repulsa pode te privar de algumas das melhores coisas da vida; como a raiva é um dos sentimentos mais poderosos e mais desperdiçados; como você confunde felicidade com fuga da realidade; e como enfrentar a tristeza vai revelar o que realmente é importante na sua vida.
O Medo! O medo é um dos sentimentos mais importantes de qualquer ser vivo. O medo é fundamental para preservar a própria vida. O grande problema é que a maioria de nossos medos é de coisas que nunca vão acontecer, medos que existem apenas em nossas mentes, medos que inventamos. Pare e pense: quantos de seus medos são de riscos que não existem, que preservam bens e valores que na verdade sequer possuímos? E quantas vezes você não vive sua vida morrendo de medo de não corresponder às expectativas dos outros e deixa de perseguir seus próprios sonhos para nunca ter sucesso na impossível tentativa de ser o que você imagina que os outros esperam que você seja? Entenda com muito cuidado seus medos. A pior atitude que você pode ter é ter medo de seus próprios medos.
A Repulsa é mais um sentimento de proteção contra o que você não conhece. Essa aversão pelo desconhecido te protege de muitas coisas, como uma comida estragada. Mas a repulsa também te priva de coisas maravilhosas, como, talvez, comer um belo polvo grelhado. Os exemplos gastronômicos são os mais simples. Eu não como fígado porque, sendo sincero, sinto um certo nojinho. Se faltarem alimentos, tenho certeza de que não vou hesitar e provar a iguaria. Mas a repulsa que sentimos do que ainda não conhecemos pode ter impactos muito mais importantes e profundos. Os preconceitos nascem desse mesmo sentimento. Muita gente pensa sobre minorias com um claro sentimento repulsa. Essa aversão ao desconhecido pode ser um sentimento natural do ser humano. No entanto, deixar de conhecer pessoas interessantes, limitar sua vida à pequena fatia do mundo que lhe é familiar, manifestar ódio a quem você não conhece, não só é um comportamento frequentemente terrível e cada vez menos aceito, como também reduz sua própria vida à província desinteressante que é um mundo só de gente igual. É muito importante reconhecer a existência dos preconceitos que existem em cada um de nós, para entender que você pode, sim, decidir não comer fígado, mas não tem o direito de odiar quem você não conhece.
Poucos sentimentos são tão importantes quanto desperdiçados quanto a Raiva. A raiva pode ser construtiva e inspiradora; como pode ser destrutiva e paralisante. Quando aprendemos a separar o que realmente importa do que é irrelevante, a raiva passa a ser um combustível para a criação e transformação de nossas vidas. Sabe a velha frase "eu não levo desaforos para casa"? Pois bem, poucas coisas são tão tolas quanto isso! De que adianta o desgaste de uma briga com quem não tem qualquer importância para você? Ignore, pense na energia que será dissipada e o espaço em sua mente que algo irrelevante pode ocupar. Guarde sua raiva para o que importa: raiva de ver alguém que você gosta tomando decisões erradas, a raiva de não ter se dedicado a seus objetivos como gostaria, a raiva por ter agido de forma incorreta com seus colegas. Esse tipo de raiva "boa" é importante, faz você crescer, construir coisas novas. A raiva é um termômetro muito preciso para medirmos ao que damos importância na vida. Se a temperatura está alta, pare e reflita se realmente há motivos concretos para deixar a cabeça esquentar. Seja franco com você mesmo e certamente você perceberá que o termômetro está na temperatura errada e que essa febre não vale a pena.
A Felicidade, coitadinha, é um sentimento mal compreendido. Acreditamos que a felicidade acontece no êxtase de momentos de diversão, quando estamos gargalhando ou relaxando sob o sol. Mas quem nunca sentiu aquela sensação incômoda de culpa e rejeição no meio das férias, simplesmente por lembrar de sua rotina "normal"? Pois então: confundimos com muita frequência felicidade com fuga da realidade; felicidade com momentos avulsos de alegria. É claro que esses momentos são importantes, mas não são felicidade. Felicidade é uma sentimento muito mais complexo, permanente, de olhar para a própria vida e dizer "valeu a pena". A felicidade não se constrói em momentos isolados, mas ao longo dos anos, por meio das escolhas que fazemos, das batalhas que enfrentamos, dos amores que vivemos. Não há felicidade instantânea, felicidade é uma conquista - uma conquista que vale a pena, mas que não é fácil. Quase que invariavelmente, a felicidade está ligada às escolhas difíceis que fazemos ao longo da vida. Fazer a escolha do difícil, sair da zona de conforto, aprender, enfrentas desafios... é assim que se olha para uma existência e pode-se pensar: sou feliz!
E a Tristeza… A tristeza é um sentimento muito importante, tão importante e poderoso que costumamos fugir rapidamente de tudo que nos faz triste. Mas a tristeza nos mostra o que é relevante, o que nos faz falta, quais perdas realmente causam dor. Sem sofrimento, é praticamente impossível aprender, saber o que devemos valorizar, entender quais são as escolhas difíceis que temos de fazer. Tristeza e felicidade ocupam os mesmos espaços em nossas mentes. Em geral, onde há um, o outro não consegue existir. Por isso que as escolhas importantes da vida são tão difíceis: elas normalmente envolvem decidir sobre abrir mão de um caminho que talvez também nos fizesse feliz. A grande lição é que sem fazer escolhas, sem passar pela tristeza de algumas decisões e seguir em frente, provavelmente nunca seremos felizes. E aprender que a tristeza é parte essencial da vida e um sentimento tão nobre quanto a felicidade é um dos mais importantes aspectos da maturidade.
Esse artigo é só um pequeno empurrão para você começar uma das jornadas mais difíceis e fascinantes de sua vida, a jornada para dentro de você mesmo. Tenha uma certeza: se você enfrentar seus medos, superar suas repulsas, controlar sua raiva e não fugir da tristeza, você certamente encontrará o caminho para construir uma vida muito mais feliz. E é só isso que realmente importa.
Leandro Waldvogel (contato@waldvogel.com.br) é autor, palestrante, coaching de alta performance e consultor de empresas. Foi diplomata, trabalhou para a Disney Co., professor de programas de MBA no Brasil e exterior. É especialista em storytelling aplicado ao mundo corporativo. www.waldvogel.com.br
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