Por Leandro Waldvogel
"Enfrentar nossos fantasmas, levantar as máscaras que nos protegem do olhar cínico do mundo que nos cerca e de nossa própria consciência, são algumas das escolhas difíceis que temos de fazer em nossas vidas se desejamos ter sucesso e felicidade."
Há alguns anos, eu entrevistava um candidato a uma posição de gerente júnior em uma grande empresa. Eu adoro entrevistas de emprego. Para mim, ainda é a melhor ferramenta para se conhecer quem aspira a uma vaga no mundo do trabalho. A entrevista seguia sem grandes emoções, dentro do que se espera de um rapaz inteligente, com uma ainda curta, porém bem conduzida carreira no mundo corporativo. Até que fiz uma dessas perguntas padrão que, particularmente, gosto muito, a famigerada: "qual é seu maior defeito?" Essa pergunta sempre é uma grande oportunidade para o entrevistado revelar aspectos muito valiosos de sua personalidade, mas que quase sempre é desperdiçada com respostas genéricas e desprovidas de conteúdo.
Os olhos de meu candidato revelaram um instante de hesitação, que precedeu sua resposta: "sou desonesto." Olhei fixamente para o rapaz, com uma mistura de surpresa e curiosidade. Não falei nada, mas ele mesmo prosseguiu. Disse que sempre passou por sua cabeça abrir mão da honestidade para conquistar seus objetivos. Disse também que já pagou caro por esse comportamento, mas que já houve momentos em que ele se beneficiou por ter agido sem muita ética. E que, refletindo sobre essa sua característica, percebeu que se talvez não curto prazo, no longo prazo, a falta de honestidade iria cobrar-lhe um alto preço. Ele precisava corrigir esse comportamento, conectar-se com esse valor que não lhe parecia muito caro.
Essa talvez tenha sido a resposta mais honesta que já ouvi de um candidato. É preciso de muita honestidade para revelar que é uma pessoa desonesta. E não só honestidade, também é preciso de muito autoconhecimento e coragem para revelar algo considerado tão negativo.
A verdade - a verdade mais honesta - é que temos muita dificuldade para admitir para nós mesmos que, escondidas por trás de nossas tantas máscaras, escondem-se algumas características que não temos coragem de revelar nem para nós mesmos.
O problema é que essas características negativas estão lá, agindo sorrateiramente, no caminho dos nossos objetivos, atrapalhando nossos sonhos. Reconhecê-las não é fácil, mesmo para quem acredita que seja. Se você fizer um teste agora, e tentar buscar quais são de fato seus maiores defeitos, vai perceber que há um grande esforço envolvido nesse exercício.
Mas reconhecer é o primeiro e necessário passo para lidarmos com esses desafios de nossas personalidades. Talvez as características mais importantes da personalidade de um líder sejam a curiosidade, a coragem e o autoconhecimento. Essas três características estão profundamente interligadas. O indivíduo precisa ter curiosidade sobre si mesmo para se questionar, para buscar respostas; tem de ter coragem para enfrentar as respostar que encontrará nessa busca; e só essa busca pode levá-lo a se autoconhecer.
A resposta de meu candidato revelou tudo isso. Revelou alguém que se conhece. Uma pessoa com coragem para "se" enfrentar e para enfrentar o mundo. E mostrou-me o esforço de um jovem para superar um traço tão negativo de sua personalidade. Depois de terminado o processo, recomendei com muita ênfase que ele fosse o candidato contratado. E ele foi.
5 anos depois da entrevista, escrevo este texto logo após ter recebido uma mensagem desse rapaz, pedindo minha opinião sobre uma nova posição que estão lhe oferecendo em uma grande empresa. Descobri que ele se tornou um líder muito bem-sucedido, pronto para enfrentar o novo desafio.
Conversamos por WhatsApp. Para ele, honestidade hoje não é nem mais um defeito, tampouco uma qualidade. É o mínimo que pode se esperar de alguém. Mas o melhor da história é que ele me revelou que nessa trajetória que não terá fim, encontrou defeitos ainda mais bem escondidos por trás de suas tantas máscaras. E seu desafio de superá-los e ser um profissional cada vez melhor é hoje uma fonte extraordinária de motivação.
Enfrentar nossos fantasmas, levantar as máscaras que nos protegem do olhar cínico do mundo que nos cerca e de nossa própria consciência, são algumas das escolhas difíceis que temos de fazer em nossas vidas se desejamos ter sucesso e felicidade. As escolhas fáceis nos aprisionam em uma zona de conforto que certamente cobrará um preço altíssimo no futuro. É apenas fazendo escolhas conscientes pelo desafio que trilhamos uma trajetória de realizações e de conquistas em nossa vida pessoal e profissional.
Leandro Waldvogel é palestrante reconhecido internacionalmente, coach de carreira, consultor de comunicação corporativa, e professor de programas de MBA no Brasil e Estados Unidos.
https://www.linkedin.com/pulse/entrevista-de-emprego-o-candidato-desonesto-leandro-waldvogel/
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